Ao longo de toda a sua vida como estudante, acadêmico, teólogo e Papa, Bento XVI demonstrou sua admiração por Santo Agostinho em diversos momentos, como em seus discursos e catequeses, em sua tese de doutorado, em carta Encíclica, e como um dos símbolos de seu brasão papal.
“Fascinava-me sobretudo a grande humanidade de Santo Agostinho", explicou Bento XVI durante catequese para seminaristas. "Ele teve que lutar espiritualmente para encontrar pouco a pouco o acesso à Palavra de Deus, à vida com Deus, chegando ao grande ‘sim’ à sua Igreja". A história pessoal do filósofo de Tagaste impressionou Ratzinger, "este caminho tão humano, no qual também hoje podemos ver como se começa a entrar em contato com Deus, como todas as resistências da nossa natureza devam ser tomadas a sério e depois devam também ser canalizadas para chegar ao grande sim ao Senhor. Desta forma, fui conquistado pela sua teologia muito pessoal, desenvolvida sobretudo na pregação".
A tese “agostiniana” em teologia
Em sua na sua vida pessoal, a figura do bispo de Hipona sempre esteve presente. Em 1953, o promissor Joseph sacerdote e já brilhante acadêmico se formou em Teologia na Universidade de Munique com uma dissertação sobre a relação entre o Povo de Deus e o Corpo de Cristo em Agostinho - 'Povo e Casa de Deus na Doutrina da Igreja de Santo Agostinho' - com base no que o Doutor da Igreja escreve na 'Exposição sobre o Salmo 149'. A tese foi publicada e no prefácio da edição italiana de 1978 Ratzinger delineou o resultado central de sua pesquisa, especificando que "a releitura cristológica do Antigo Testamento e a vida sacramental centrada na Eucaristia são os dois principais elementos da visão agostiniana da Igreja".
O desejo de uma vida contemplativa
Outro aspecto da vida de Santo Agostinho que Bento XVI destacou durante sua visita ao Seminário Maior Romano, por ocasião da festa de Nossa Senhora da Confiança: ele desejava viver, inicialmente, "uma vida meramente contemplativa, escrever outros livros de filosofia... mas o Senhor não quis, fez dele um sacerdote e um bispo e, assim, o resto da sua vida, da sua obra, desenvolveu-se substancialmente no diálogo com um povo muito simples." Era a mesma coisa que Ratzinger desejava: retirar-se da vida pública para se dedicar à meditação e ao estudo. Como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé desde 1981, solicitou várias vezes sua demissão, que João Paulo II não concedeu.
Sua primeira Encíclica: Deus caritas est
Eleito Papa em 16 de abril de 2005, alguns meses depois, no Natal, Bento XVI entregou à Igreja sua primeira carta encíclica, Deus caritas est, dedicada ao amor cristão. Foi inspirado mais uma vez por Santo Agostinho. No documento, apresenta uma síntese do conceito de amor, a única luz "que sempre ilumina novamente um mundo escuro e nos dá a coragem de viver e de agir". "O amor é possível, e nós somos capazes de praticá-lo porque fomos criados à imagem de Deus. Viver o amor e assim deixar a luz de Deus entrar no mundo, isto é o que eu gostaria de convidar com esta Encíclica".
Peregrino no túmulo de Santo Agostinho
Em 22 de abril de 2007, em visita a Pavia, Bento XVI deixou ainda mais claro o quanto se sentia próximo de Santo Agostinho. Diante do túmulo do Bispo de Hipona, o Papa Ratzinger também quis "entregar idealmente à Igreja e ao mundo", sua primeira Encíclica, "amplamente devedora ao pensamento de Santo Agostinho, que foi um apaixonado do Amor de Deus, e o cantou, meditou, pregou em todos os seus escritos, e acima de tudo testemunhou no seu ministério pastoral".
Um símbolo "agostiniano" no brasão papal
Para seu brasão papal Bento XVI escolheu, entre outros símbolos, uma concha, que também tem um significado agostiniano. A história conta que Agostinho notou uma criança em uma praia que estava continuamente tirando água do mar com uma concha e depois despejando-a em um buraco cavado na areia, e pediu explicação. O menino respondeu que queria colocar toda a água do mar naquele buraco. "Agostinho compreendeu a referência a seu inútil esforço em tentar fazer entrar o infinito de Deus na limitada mente humana". A lenda tem um evidente simbolismo espiritual, para nos convidar a conhecer Deus, ainda que na humildade das inadequadas capacidades humanas, nutrindo-nos na inesgotabilidade do ensinamento teológico".
A estátua de Santo Agostinho no Mosteiro Mater Ecclesiae
Na capela do Mosteiro Mater Ecclesiae, nos Jardins do Vaticano, há uma estátua de Santo Agostinho, em frente ao altar. É uma antiga estátua de madeira em que o bispo de Hipona é representado com as vestes de prelado. Ao seu lado está uma criança segurando uma concha, protagonista da lenda agostiniana que Bento XVI quis recordar em seu brasão. Concha que também está presente no brasão do antigo Mosteiro de Schotten, em Regensburg, ao qual Joseph Ratzinger se sentia espiritualmente muito ligado, e é também o símbolo do peregrino. Justamente onde se concluiu a peregrinação terrena de Bento XVI, Santo Agostinho parece dar testemunho o quanto Joseph Ratzinger deu ao mundo.
Inspirado em Santo Agostinho
No vídeo abaixo, o Frei Diones Rafael Paganotto, OAD, membro da Cúria Geral dos Agostinianos Descalços de Roma, reflete sobre a ligação e marcas do pontificado e da pessoa de Bento XVI a Santo Agostinho.
O Prior Geral sobre Bento XVI
Em carta, o Prior Geral lamentou a morte do querido Papa emérito, "cujo grande testemunho de simplicidade e humildade permanecerá sempre conosco”. Destacou a “profunda teologia e enorme amor pela Igreja” de Bento XVI, que teve Santo Agostinho como seu “grande mestre”. E exortou as comunidades e os fiéis a “se unirem em oração pelo descanso eterno” do Papa Bento XVI.
A Ordem de Santo Agostinho deseja une-se às orações pelo descanso eterno do Papa que pastoreou o Povo de Cristo em um momento de profundas mudanças na sociedade e na vida da Igreja. Fiel estudioso da obra e do legado de Santo Agostinho, a quem dedicou sua tese de doutorado, enalteceu a figura do Bispo de Hipona (“onde todos os caminhos levam) no catecismo sobre os Padres da Igreja durante a Audiência Geral das quartas-feiras durante o ano de 2008.
Descanse em paz, Santo Padre.
Fonte e imagens: VaticanNews, Cúria Geral Agostiniana, Canção Nova.