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nov/24

A mansidão pressupõe uma ação

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A esperança cristã é necessária, mas pode muitas vezes soar de maneira passiva em nossas vidas. Como acreditamos em um Deus que é sempre fiel àqueles que creem, muitas vezes adotamos uma atitude passiva diante da vida, esperando que as coisas se resolvam por si mesmas. É como se esperássemos que Deus organizasse nossa vida sem nossa participação ativa.

Isso é um equívoco do pensamento humano. A vida sempre nos pede uma atitude. Ainda que nos submetamos estritamente à vontade de Deus, nada acontecerá em nossas vidas sem nossa participação. E isso acontece porque a própria vida só é sentida por nós através dos nossos corpos em ação com o mundo externo.

Sim, isso pode parecer estranho para nós, até porque ouvimos na própria Escritura que devemos ser “mansos e humildes de coração” (cf. Mateus 11, 29), como o próprio Cristo, encarnado no meio da humanidade, nomeou aquelas suas atitudes tomadas diante das adversidades do mundo e das relações humanas.

Santo Agostinho também refletiu sobre a mansidão como uma atitude cristã primorosa e importante diante das dificuldades da vida humana. Ele define muito bem o que é a mansidão no Sermão 81, 5, ao afirmar que “a pessoa mansa é aquela que só visa agradar a Deus em todo bem que ela faz e que não desagrada a Deus, seja qual for o mal que ela sofra”. Para o doutor da Igreja, o ponto de partida e chegada de nossas ações sempre será Deus. A mansidão é uma atitude do cristão diante da frustração e da angústia comuns a todo ser humano. É uma decisão que ele toma para articular seu desejo e sua vontade a partir daquilo que está escrito na Sagrada Escritura, com o intuito de agir conforme os mandamentos de Deus.

“Vamos, cristãos! Vamos, povo celeste! Vocês, que são peregrinos neste mundo e que procuram no céu uma pátria, com o desejo de estarem associados aos anjos, compreendam que vocês só vieram a este mundo para saírem dele. Vocês atravessam este mundo procurando, com esforço, Àquele que criou este mundo. Não se deixem perturbar pelos amigos do mundo; por aqueles que querem permanecer nele e, querendo ou não, são forçados a deixá-lo. Não se deixem enganar e nem seduzir por eles (Santo Agostinho in Sermão 81, 7). Entender as motivações que nos levam a agir diante do mundo e das dificuldades que se apresentam é uma forma de vivermos a mansidão em nossos atos e pensamentos diários. Isso nos dá a certeza de que estamos construindo um caminho que nos leva sempre diretamente a Deus e à nossa santificação.

Mas, para isso, é necessário um esforço concreto e real que nos leve à mudança. Santo Agostinho nos recorda que “para mudar a conduta, é preciso primeiro mudar o ser humano. Se este permanece mau, não pode agir bem. E, se é bom, não deverá agir mal” (Sermão 72,1). A dedicação e o empenho do ser humano devem estar na mudança de si mesmo. Somente assim pode se desejar o bem e construir caminhos que viabilizem a sua realização junto aos outros na sociedade. A conduta cristã não pode ser pensada apenas em termos individuais, mas, sim, coletivos. A mansidão, como uma atitude de Jesus, está sempre voltada para o outro na relação social. Aquele que se fecha em si mesmo não é uma pessoa mansa, mas egoísta. A mansidão fala de uma hospitalidade capaz de enxergar o outro como uma oportunidade de exercer o bem e de estabelecer vínculos afetivos reais e duradouros.

Enfim, a mansidão pressupõe uma ação. Essa ação nasce da esperança cristã, que é ativa por si só. As orações não são pedidos passivos de seres humanos diante de suas frustrações e angústias. A vida cristã é um constante esforço de mudança interna com ressonância na vida externa. “Mude seu coração e você mudará seu comportamento. Arranque dele a cupidez e plante a caridade. Assim como a cupidez é a raiz de todo mal, a raiz de todo bem é a caridade” (Santo Agostinho, Sermão 72,4). É a partir desse lugar da caridade que devemos começar toda reflexão sobre nossa ação no mundo. A caridade, que deve se voltar para fora de nós mesmos, é o início de todo gesto de mansidão de coração que cultivamos em nossa história pessoal, assim como, seus reflexos na história da humanidade.

Frei Arthur Vianna Ferreira, OSA

Artigo publicado na coluna Fala Agostinho, do Jornal Inquietude On-line, edição de outubro/novembro de 2024.
Imagem: Freepik

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