Este é o título da bula do Jubileu da Esperança, decretado pelo Papa Francisco, inspirada numa frase de São Paulo. Em latim: Spes non confundit (Rom 5,5).
O Jubileu, com raízes bíblicas, é um ano que recorda a misericórdia e o perdão de Deus, sempre presente no seio do Povo de Deus, peregrino na construção de um reino de paz, justiça e fraternidade. Celebrava-se a cada 50 anos, ocasião em que as dívidas eram perdoadas e os terrenos dados em garantia voltavam para seus antigos donos. Na história da Igreja, o primeiro jubileu ocorreu no ano 1300, convocado pelo Papa Bonifácio VIII. Sua celebração variou ao longo da história: a cada cem anos, a cada cinquenta anos e agora a cada 25 anos. O último Jubileu ordinário foi celebrado por São João Paulo II, em 2000, na abertura do novo milênio, proclamado como um “Milênio da Esperança”.
O Papa faz um convite a todos os cristãos e aos homens e mulheres de boa vontade de todo o mundo: “Todos sabem o que é a esperança. No coração de cada pessoa, habita a esperança como o desejo e a expectativa de coisas boas por vir, apesar de não saber o que nos reserva o futuro. Mesmo assim, a incerteza sobre o futuro pode, às vezes, gerar sentimentos contraditórios, que vão desde a confiança plena até a apreensão, da serenidade à ansiedade, da firme convicção à indecisão e à dúvida. Frequentemente nos encontramos com pessoas que estão desanimadas, pessimistas e cínicas sobre o futuro, como se nada pudesse dar-lhes felicidade. Para todos nós, que o Jubileu seja uma oportunidade para renovar-nos na esperança”.
Escrevo esta reflexão no dia 20 de janeiro de 2025. É uma data muito singular, por vários motivos.
No dia de hoje toma posse o 47º Presidente dos EUA, Donald Trump. Recentemente, ele declarou, entre outras coisas absurdas e preocupantes, que pretende anexar a Groenlândia, em defesa da segurança e soberania da “América” (o Canadá estaria incluído na nova configuração do projeto expansionista de Trump). Prometeu que um dos primeiros atos de seu governo serão severas medidas contra a imigração e presença ilegal de imigrantes no país, o que significa também expulsões em massa. Esse é um cenário de esperança para 2025?
No entanto, há outras comemorações significativas. No dia 20 de janeiro, a Igreja celebra a festa de São Sebastião, um soldado romano que foi martirizado na perseguição do imperador Diocleciano em 288. O seu nome deriva do grego sebastós, que significa divino, venerável. Sua terra de origem era Narbona, na Gália (atual França). Ele chegou a Roma, como migrante, onde alistou-se no exército romano, com a finalidade de encorajar os prisioneiros cristãos. Conseguiu chegar ao alto posto de capitão da guarda pretoriana, guarda pessoal dos imperadores Diocleciano e Maximiano. No entanto, devido ao apoio que dava aos cristãos, foi considerado traidor e sentenciado. Seu suplício inicial foram as flechas, que caracterizam sua iconografia. Posteriormente foi espancado até a morte e jogado no esgoto de Roma. Santa Luciana resgatou seu corpo, limpou-o e sepultou-o nas catacumbas. Seus restos mortais conservam-se na basílica que leva seu nome, construída sobre a catacumba em que foi sepultado. Sebastião abandonou a esperança de um mundo de vaidades e glórias efêmeras. Colocou-se a serviço de um Senhor que serve. Sua Esperança não foi defraudada.
Nas tradições afro-brasileiras, São Sebastião é identificado na Umbanda com o orixá Oxóssi, entidade das florestas e das relações entre o reino animal e vegetal. Grande caçador, comumente é representado nas florestas, caçando com seu arco e flecha. Sabemos como as tradições afrodescendentes são vítimas de preconceitos e violências. O diálogo interreligioso é uma oportunidade de recíproco conhecimento, superação de preconceitos e resistência ativa contra toda forma de violência. Celebrar São Sebastião com esse compromisso é um sinal de Esperança para 2025. Apelo que faço principalmente às nossas fraternidades religiosas e seculares, paróquias, escola social, e demais iniciativas presentes na arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro.
Dia 20 de janeiro é também o dia de Martin Luther King Jr. (1929-1968), que recorda o seu famoso discurso pronunciado nesse dia em 1963, em Washington Eu tenho um sonho (I Have a Dream). Luther King foi um pastor batista e ativista político estado-unidense que se tornou líder do movimento dos direitos civis nos EUA de 1955 até seu assassinato em Memphis, em 1968. Ele é conhecido sobretudo pela aplicação do princípio da desobediência civil e da não violência na luta por direitos políticos. Sua inspiração vem da fé cristã e do ativismo não violento de Mahatma Gandhi.
Em sua mensagem para este dia, Frei Tony Pizzo, OSA, Prior Provincial da Província Agostiniana de Chicago (EUA), afirma que recordar e celebrar a vida desse líder é uma oportunidade para refletir sobre a luta que continua hoje pelos direitos civis, a igualdade e a justiça. Frei Tony Pizzo conta uma curiosidade: há uma cópia original da carta I Have a Dream de Luther King, que se encontra na Universidade de Villanova, dirigida pelos Agostinianos. Segundo ele, a custódia de um “documento tão transformador” destaca a missão agostiniana e os valores correspondentes, especialmente na área da inclusão de todas as pessoas. E isso está alinhado com a missão do Papa Francisco de “chegar a todos os confins da Terra” e reconhecer o papel de todos na construção do Reino de Deus. Aí está outro sinal de Esperança para este ano, em que todos, como “povo da Esperança”, podemos colaborar na construção de um mundo sem barreiras nem muros raciais.
Por fim, todo dia 20 de cada mês é dedicado em nossa Província da Consolação ao Dia de Oração pelos Leigos Agostinianos. A vocação específica dos Leigos e Leigas é ser “sal da terra, luz do mundo e fermento” no “mundo secular”, ou seja, na família, no trabalho, na educação, nas artes, na política, na economia, nas redes sociais. Rezemos todos pelos nossos Leigos e Leigas, para sejam também profetas de Esperança em todos os lugares onde vivem.
Na nossa Província teremos uma Celebração Jubilar da Esperança que acontecerá na abertura do Retiro Provincial, dia 25 de fevereiro, na Igreja Nossa Senhora da Consolação e Correia, em Belo Horizonte/MG. Louvar, agradecer, suplicar e oferecer são também uma maneira singular de celebrar a Esperança, pois, de fato, a “Esperança não decepciona”!
Frei Luiz Antônio Pinheiro, OSA
Prior Provincial
Artigo publicado na coluna Reflexão, do Jornal Inquietude On-line, edição de janeiro de 2025.
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