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20
set/22

Contribuições agostinianas para frutuosa leitura da Bíblia

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A Igreja no Brasil, durante o mês de setembro, dedica especial atenção à Sagrada Escritura. As comunidades eclesiais, em suas diversas modalidades, são motivadas a refletir, estudar, meditar e rezar a Palavra de Deus contida na Bíblia Sagrada.

Na vida e nas obras de Santo Agostinho, a Sagrada Escritura reluz com brilho especial. Foi a força da Palavra, pela leitura do Apóstolo Paulo, por exemplo, que definiu sua conversão, conforme ele mesmo narra em suas Confissões:

“[...] tinha aí colocado o livro das Epístolas do Apóstolo, quando de lá me levantei. Agarrei-o, abri-o e li em silêncio o primeiro capítulo em que pus os olhos: ‘Não caminheis em glutonarias e embriaguez, nem em desonestidades e dissoluções, nem em contendas e rixas; mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não procureis a satisfação da carne com seus apetites’ (Rm 13, 13). Não quis ler mais, nem era necessário. Apenas acabei de ler estas frases, penetrou-me no coração uma espécie de luz serena, e todas as trevas da dúvida fugiram” (Conf. XII, 12, 29).

Temos de ressaltar ainda o lugar prodigioso da Bíblia em suas obras. A resenha de De Lagarde, da Universidade de Gottingen, conta 42.816 citações, sendo 13.276 do Primeiro Testamento e 29.540 do Segundo Testamento. Isso prova que, ninguém, como Agostinho, explorou tão a fundo e com tanto empenho e sutileza os profundos e obscuros recônditos da Bíblia, e nunca houve alguém que trouxesse de suas explorações tal abundância de preciosos achados.

Neste acervo, fruto do “amor pelos Livros santos”, uma obra merece destaque: o De doctrina christiana (A doutrina cristã), escrita entre os anos de 397 e 427 d.C. Nessa obra, Agostinho nos oferece um verdadeiro tratado de exegese, dispondo como argumento central o conjunto de regras que ajudam a entender as Sagradas Escrituras.

 Inspirados nessa obra, propomos ao leitor algumas contribuições agostinianas para uma frutuosa leitura da Bíblia.

  1. Disposições para a leitura e estudo das Escrituras

Seguindo o conselho do Apóstolo a Timóteo, Agostinho destaca que, para abordar com segurança o estudo dos livros sagrados, devemos conservar três disposições: “a caridade procedente de um coração puro, uma boa consciência e uma fé sem hipocrisia” (1Tm 1, 5). Caridade que procede de um coração puro para que amemos aquilo que deve ser amado; boa consciência em vista da esperança, para que o remorso de uma consciência má não nos leve ao desespero; fé sem hipocrisia porque, quando nossa fé está ao abrigo da mentira, confunde nosso amor e defrauda nossa esperança (cf. De doctrina, I, 39, 44).

2. Consequências de tomar expressões simbólicas ao pé da letra

Agostinho nos lembra que a Revelação da vontade de Deus na Escritura é feita, especialmente, por meio de sinais (signis). “O sinal é, portanto, toda coisa que, além da impressão que produz em nossos sentidos, faz com que nos venha ao pensamento outra ideia distinta. Assim, por exemplo, ao ver fumaça, percebemos que embaixo deve haver fogo...” (De doctrina, II, 1, 1). Os sinais podem ser naturais, convencionais ou, ainda, verbais; dos sinais verbais, por sua vez, decorre a linguagem escrita. A escrita permite o uso da linguagem figurativa e de expressões simbólicas. Por isso, Agostinho diz que “antes de tudo, é preciso precaver-se de tomar em sentido literal uma expressão figurada. A respeito disso, lembramos a palavra do Apóstolo: ‘A letra mata e o espírito vivifica’ (2Cor 3,6) [...] Com efeito, o homem que segue só a letra toma como próprias as expressões metafóricas, e nem sabe dar a significação verdadeira ao que está escrito com palavras próprias” (De doctrina, II, 5, 9). A descoberta do significado das expressões deve considerar o seguinte: “tudo o que na palavra divina não puder se referir ao sentido próprio, nem à honestidade dos costumes, nem à verdade da fé está dito que devemos tomar em sentido figurado. A honestidade dos costumes tem por fim o amor de Deus e do próximo; a verdade da fé visa ao conhecimento de Deus e do próximo” (De doctrina, II, 10, 14). 

3. O Amor: plenitude das Escrituras

“Se alguém julga ter entendido as Escrituras divinas ou partes delas, mas se com esse entendimento não edifica a dupla caridade – a de Deus e a do próximo -, é preciso reconhecer que nada entendeu” (De doctrina, I, 35, 40).

Para Agostinho, a plenitude da Escritura Sagrada é o amor. De tudo que fora escrito e conservado na Bíblia, esta é a suma: “que se entenda ser a plenitude e o fim da lei, como de toda a Escritura divina, o amor àquela Coisa, que será nosso gozo (Rm 13, 10 e 1Tm 1, 5); e o amor dos que podem partilhar conosco daquela fruição” (De doctrina, I, 35, 39). Nossa reverência e uso das Sagradas Escrituras devem, portanto, considerar essa disposição da Providência: utilizar meios humanos para nos fazer conhecer realidades divinas; servir-se de instrumentos terrenos para fazer-nos chegar ao céu. O caminho mais seguro para essa viagem, contudo, é a Palavra Encarnada, o homem Cristo Jesus “sacramento” excelente do ser-amor de Deus.

- Texto produzido para a coluna Theos, do Jornal Inquietude On-line, de setembro de 2022.

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